quarta-feira, 29 de julho de 2009

Liberdade - essa palavra (parte 2)

Olha lá a palavra liberdade, me pegando mais uma vez de surpresa numa página de jornal. Outro livro, outro autor, outro assunto, e a mesma velha liberdade a nos servir de farol. Esse eu ainda não li. Traz como título A imprensa e o dever da liberdade e foi escrito por meu amigo Eugênio Bucci. Acaba de ser lançado pela Contexto, sem coquetel nem nada, como exige a rotina low-profile de um jornalista e professor sempre ocupado. Justamente por essa ausência de rituais e burburinhos, fui pego de surpresa pela crítica publicada no Estadão de domingo pelo Janine Ribeiro. Nem sabia que o livro estava pronto e lá vinha o cientista político a discorrer sobre a obra, a apontar seus trunfos e a acusar sua obrigatoriedade. Pela crítica lida, pelo título do volume e pelo porte do autor, A imprensa e o dever da liberdade entra desde já para a categoria dos livros que ainda não li, mas já gostei.


Curiosa a liberdade de imprensa. Vive prensada entre duas liberdades distintas, e tão íntimas: a liberdade do jornalista (e do jornal), de apresentar notícias e fatos sem a censura das autoridades da política e dos barões da economia, e a liberdade do leitor, de ser informado de maneira isenta e aprofundada. Uma não perdura sem que a outra exista. E vice-versa. Ad infinitum. Mas, jornalistas que somos (Bucci, eu e a maioria dos raros leitores deste blog), temos de estar atentos permanentemente ao que o título chama de "dever de liberdade". Faz-se aqui uma inversão notável. Não se trata de "direito à liberdade", mas de dever. E esse dever não pode jamais deixar de ser um hábito, uma preocupação e uma intenção. Tampouco pode baixar os olhos perante o mercado anunciante ou a negociação de uma dívida com o BNDES - por mais ingênuo e romântico que um comentário desses possa parecer diante do Ibope e da tirania da tiragem.

É essa a seara sobre a qual Eugênio Bucci se debruça, retornando mais uma vez ao tema da ética (que lhe é tão caro). "Os jornalistas e os órgãos de imprensa não têm o direito de não ser livres, não têm o direito de não demarcar a sua independência a cada pergunta que fazem, a cada passo que dão, a cada palavra que escrevem", resume o autor logo no primeiro capítulo. "Cultivar, exercer e tornar cada vez mais explícita a liberdade com que exercem o seu ofício é o primeiro e o mais alto dever dos profissionais da imprensa."

O jornalista "deve" ser livre ao redigir uma reportagem sobre economia ou política, o que torna no mínimo estranho descobrir que o profissional fez a entrevista durante um almoço... pago pelo entrevistado. O jornalista "deve" ser livre ao tecer a crítica de um filme, o que torna no mínimo estranho descobrir que o profissional viajou aos Estados Unidos para cobrir a pré-estréia... a convite do estúdio ou da produtora. O jornalista "deve" ser livre para entender que o seu patrão é o leitor, e não o anunciante. E para que possa agir segundo esse princípio. O que está em jogo, muito além da qualidade da informação ou da alegria de publicar um furo (ou uma exclusiva), é a credibilidade da imprensa enquanto instituição. Todos nós sabemos o que acontece quando uma instituição se torna refém do fisiologismo e de práticas não-pautadas pela ética. E quando um servidor esquece quem é, de fato, seu patrão.

Vou buscar o meu exemplar ainda nesta semana.

2 comentários:

  1. Sempre me deslumbro com a precisão do seu pensamento! Um abraço. Cris.

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  2. Justo hoje que o Estado acusa o colunista da Folha de censura vejo seu post. Entre pistas e carros, anda me faltando um pouco de Engênio Bucci nos miolos. Vou tratar disso com a sua sugestão.
    Abração

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