domingo, 4 de abril de 2010

Próxima parada: Jaçanã

Adoniran Barbosa completaria 100 anos daqui a quatro meses. Inspirados pela efeméride, nós da Época São Paulo decidimos homenageá-lo com uma dessas reportagens de memória que, de uns tempos para cá, tenho adorado fazer. Primeiro, escrevi sobre os tempos áureos da Cinelândia Paulistana, quando o pessoal tinha de vestir terno e gravata (ou vestidos longos) para entrar no Cine Marrocos, no Art-Palácio, no Ipiranga e no Marabá, entre outras mais de vinte salas instaladas no centro da cidade entre os anos 1940 e 1950. Em janeiro, emplaquei uma grande matéria sobre a prisão do Lula, em 1980, reconstituindo a greve dos metalúrgicos do ABC e os 30 dias em que o atual Presidente permaneceu encarcerado no Dops. Desta vez, o recorte escolhido foi narrar os bastidores da composição e da primeira gravação, em 1964, do samba "Trem das Onze", a mais conhecida música de Adoniran e, provavelmente, a que melhor representa São Paulo.


Escrita por um paulista de Valinhos e impressa pelo conjunto vocal Demônios da Garoa em um LP da Chantecler, "Trem das Onze" estourou no Rio de Janeiro em fevereiro de 1965, arrebatando o troféu de música mais executada do Carnaval daquele ano, quando a capital fluminense comemorava 400 anos. De lá, alcançou projeção nacional e serviu para enterrar, com o perdão do trocadilho, a pecha de "túmulo do samba" atribuída a São Paulo por Vinícius de Moraes. Os dois primeiros parágrafos estão reproduzidos a seguir. Clique aqui para ler o texto na íntegra, que se estende por três páginas (observe a navegação no pé da página inicial), conferir uma entrevista em vídeo com os Demônios e ouvir trechos de dez sambas nos quais Adoniran faz referência a ruas e bairros da capital.


"Caixinha de fósforos nas mãos, Adoniran aproveitava a viagem para compor. Os versos surgiam entre uma estação e outra, ritmados pela cadência do vagão. Especialista em criar tipos urbanos, o artista, nascido em Valinhos em 6 de agosto de 1910, tirava samba dos trilhos. E traduzia, na nova música, a história de um rapaz que tinha de deixar a namorada sozinha para voltar para casa e cuidar de sua mãe. “Se eu perder esse trem, que sai agora às 11 horas, só amanhã de manhã.” Um dos bairros atravessados pela ferrovia acabou entrando na letra por acaso. Era preciso encontrar uma rima. “Manhã... manhã... Jaçanã! Achei bonito o nome”, confessou Adoniran em uma entrevista de 1974, dez anos depois do lançamento da canção que é a cara de São Paulo.
Adoniran barbosa faria 100 anos em agosto. E ficaria todo prosa ao saber que “Trem das Onze” ainda ocupa lugar de destaque na predileção dos paulistanos. Toda terça-feira, uma centena de pessoas vai ao Bar Brahma assistir aos Demônios da Garoa, que sempre encerram o show com seu samba mais famoso. Sentado em uma das mesas, Adoniran abriria um sorriso, pediria um cigarro “emprestado” (para fumar na calçada, é claro), ajeitaria a gravata-borboleta e, no repique da inseparável caixinha de fósforos, cantaria com a plateia. Em tempos de Beyoncé e “Rebolation”, ele descobriria que seus versos continuam reverenciados como um hino. Seis anos atrás, por exemplo, os 450 anos de São Paulo inspiraram uma campanha da TV Globo para eleger a música “com a cara da cidade”. O povo escolheu “Trem das Onze”, uma senhora de 40 anos que, até então, já tinha sido gravada em francês, espanhol, italiano e hebraico."

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