quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Troca de gentilezas

"Ele é viado e fuma maconha". O dono da frase poderia ser um carola de igreja, desses que papam mingau de hóstia no café da manhã. Também poderia ser um desses policiais rudes que fazem bico de leão de chácara em porta de boate e, durante o dia, malham até as orelhas em uma academia de fundo de quintal, doidos para descer o cacete em um larápio qualquer. Mas não: foi proferida por um governador de estado, chefe do executivo sul-mato-grossense, representante do poder Executivo eleito pelo povo e diplomado em solenidade pública perante o Legislativo. O alvo? O ministro do meio ambiente.


André Puccinelli parece ter perdido a razão. Ou, talvez, nunca tenha tido. Reagiu com as gentilezas acima ao ser questionado por líderes do comércio e da indústria local a respeito da recente decisão, conduzida pelo ministro Carlos Minc, de vetar o plantio de cana de açúcar em certas áreas do estado próximas ao Rio Paraguai. Ruralista e defensor dos latifúndios canavieiros - daqueles que acham que o ideal do Brasil é mesmo se tornar um "imenso canavial" - Puccinelli não poupou escatologia ao disparar seus petardos contra o ambientalista. Em seguida, por mais incoerente que possa parecer, ameaçou abusar sexualmente do mesmo ministro: "Se ele viesse (a Campo Grande), eu correria atrás dele e o estupraria em praça pública", afirmou.


Quem tem 30 anos ou mais provavelmente se lembra de uma frase famosa, dita em 1989 por um político com ideias semelhantes às exibidas por Puccinelli, que instruía bandidos a, havendo a necessidade íntima de cometer violência sexual, o fizesse sem colocar em risco a vida da vítima. "Tá com vontade sexual, estupra, mas não mata", eram os termos exatos. Já quem tem menos de 30 anos está cansado de saber que toda manifestação depreciativa em razão de orientação sexual, cor ou credo, entre outros aspectos, é passível de punição penal. Pelo menos na teoria.
Em vez de continuar à frente do governo, fazendo retumbar suas bravatas de menino-macho, talvez fosse hora de o homem da cana entrar em cana, devidamente emparedado pelo Ministério Público e lacrado pelo Supremo Tribunal de Justiça. Triste o país que não leva adiante sua indignação com as habituais afrontas feitas aos direitos humanos, comuns inclusive entre seus dirigentes. Algumas afrontas, a história mostra, estupram e matam.

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