sábado, 14 de maio de 2011

A volta do médico-monstro

A reportagem de capa da edição de hoje da Revista Época calou fundo dentro de mim. Estou até agora engasgado com o café da manhã. Fazendo um rápido resumo, a revista revela, com base em depoimentos prestados à polícia e ao ministério público, que casais assistidos pelo médico Roger Abdelmassih descobriram que as crianças geradas por eles não são seus filhos biológicos. Em outras palavras, desembolsaram fortunas para dar à luz bebês que, no mínimo, foram concebidos in vitro com óvulos e/ou espermatozóides alheios, reeditando a barriga de aluguel. E sem o consentimento dos "doadores" involuntários dos gametas. Digo no mínimo porque o médico-monstro, vale lembrar, foi condenado a 278 anos de prisão por uma série de crimes que inclui, entre outros, estupro. Estupros realizados ali mesmo, no cativeiro de luxo da Avenida Brasil, com pacientes desacordadas.


Estou grávido, como já revelei aqui mesmo no blog, o que faz aumentar ainda mais minha indignação. Aline e eu tivemos a felicidade de engravidar, naturalmente, após dois ou três meses de "tentativas". Um bebê desejado, querido, concebido à moda antiga, quando muitos casais veem-se impelidos a apelar para os avanços científicos a fim de, num último gesto de esperança, perpetuar sua herança genética por meio da fertilização assistida. Quantas mulheres, frágeis e desesperadas, adentraram a clínica do Dr. Roger, hoje um criminoso com a licença médica cassada, dispostas a empenhar o que fosse preciso para realizar o sonho da maternidade? E quantas aceitaram caladas, por tanto tempo, as humilhações a que foram submetidas, cientes de que o tão sonhado bebê estagiava numa lâmina de vidro em algum escaninho do laboratório daquele monstro - e poderia ser esmagado em segundos pelas garras do doutor maldade se ousassem enfrentá-lo?


Terminei a leitura convencido de que, após a morte de Osama Bin Laden, está na hora de o governo brasileiro pedir auxílio à CIA e às armas norte-americanas, se preciso for, para capturar e prender esse terrorista: um ser abjeto e horripilante, sem barba ou turbante, mas munido de uma mente doentia que desafia os limites da brutalidade humana. Pensei na Cilene, uma colega jornalista que, muito tempo atrás, torceu o nariz ao ouvir o nome de Roger numa reunião de pauta. Por algum motivo, ela já não gostava dele. Pensei em Carla, amiga querida e mãe de duas filhas maravilhosas, que cumpriu por quase nove anos uma angustiante maratona de tratamentos, consultas e exames, com diferentes médicos e métodos, até remediar a má formação uterina que a impedia de engravidar. Pensei em Cláudia, aluna da Aline, que virou especialista no assunto de tanto investir na mesma jornada, e, jornalista premiada, ainda não obteve o prêmio mais ansiado. Pensei na Amanda, minha irmãzinha querida, que chegou à nossa família com dois meses de idade, após um longo processo de adoção, e continua enchendo de alegria nossas vidas. Receba, Tiche, meu abraço e meu agradecimento por ter confiado nessa forma tão linda e terna de gestação.

A todas essas mulheres, e a todas aquelas que levarão uma vida para superar o trauma causado por um canalha com diploma de doutor, minha admiração e minha solidariedade.

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