quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Prenderam o Lula

Foi em 1980, no dia 19 de abril, quando o presidente da República ainda era apenas um presidente de sindicato. Trinta anos antes de se tornar "o cara" e ter sua biografia registrada no panfleto hagiográfico de Fábio Barreto, Lula comandou a maior greve de trabalhadores do ABC Paulista, então considerado a "locomotiva" econômica do País. Historiadores e cronistas afirmam que ele soube, naquele momento, aproveitar a visibilidade conquistada para fundar um partido e dar início à ascensão política que, mais tarde, o alçaria à posição de líder mundial incontestável. Para isso, foi preciso pagar um preço: o preço de passar 31 dias detidos em uma cela do Dops.


Naquela época, fazer greve era ilegal - e quem insuflasse a desordem poderia ser taxado de subversivo e enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Foi o que aconteceu com Lula, que dividiu uma jaula de 25 metros quadrados - e um único vaso sanitário - com outros dirigentes do sindicato (eram treze na maior parte do tempo). Ao longo de 31 dias, ele trapaceou no baralho, discutiu política, virou amigo do Tuma e deixou o xadrez, escoltado por dois delegados, para assistir ao enterro de Dona Lindu, sua mãe.
Os bastidores da greve de 1980 e da prisão do Lula são os temas da minha mais recente matéria, publicada na Revista Época São Paulo de janeiro (nas bancas até esta sexta-feira). São dez páginas ilustradas com fotos históricas e documentos colhidos por mim junto ao acervo do Dops no Arquivo Público do Estado de São Paulo, entre eles a foto do prontuário (reproduzida acima), as digitais do presidente, a capa do inquérito policial e o alvará de soltura. Quem não puder adquirir um exemplar pode ler a versão online da reportagem clicando aqui.


Para fazer a matéria, tive a oportunidade de entrevistar o presidente, numa visita ao gabinete paulistano da Presidência da República (localizado no terceiro andar do prédio do Banco do Brasil da Avenida Paulista). Aproveitei os melhores trechos da entrevista para criar um vídeo, disponível no Youtube, que traz também alguns dos documentos que compõem o prontuário de Lula no Dops e imagens da greve "emprestadas" do documentário Linha de Montagem (1982), gentilmente cedidas por seu diretor, Renato Tapajós.
Olhar essa história pelo retrovisor, observar as conquistas da "classe trabalhadora" e verificar o quanto a democracia brasileira evoluiu de 1980 para cá - possibilitando o fim da ditadura, da inflação e de outros demônios - provoca uma réstia salutar de ufanismo que, mesmo que de maneira tímida, sublinha cada parágrafo da matéria. Trata-se de um período da nossa história que, como tantos outros momentos, precisam ser lembrados para jamais serem repetidos.

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